Personagem do primeiro time das artes plĂ¡sticas nacionais, popularizado pelo traço suave e inventivo que marcou as capas de clĂ¡ssicos da MĂºsica Popular Brasileira, Elifas Andreato concluiu ontem a instalaĂ§Ă£o do painel “A verdade ainda que tardia”, de 5m por 1,80m, que retrata as atrocidades sofridas pelos presos polĂticos durante a ditadura militar no Brasil. (Clique sobre a imagem para visualizar em alta resoluĂ§Ă£o.)
A obra serĂ¡ inaugurada hoje, Ă s 15 horas, na CĂ¢mara dos Deputados, durante a solenidade de devoluĂ§Ă£o simbĂ³lica dos mandatos de 173 parlamentares cassados entre 1964 e 1977. O painel foi doado pelo artista ao Congresso Nacional e deverĂ¡ ficar exposto permanentemente no corredor de acesso ao plenĂ¡rio, por onde circulam cerca de 10 mil pessoas por dia.
Elifas descreve seu trabalho no desenvolvimento da obra como um mergulho intenso e sombrio, que lhe custou horas de angĂºstia e sofrimento durante trĂªs meses.
“É um retrato do horror. Do meu jeito, Ă© um documento definitivo sobre esse perĂodo”, define o artista. “Eu denuncio a barbĂ¡rie sem rodeios”, diz.
Ele conta que procurou registrar o sofrimento humano em situações extremas, com foco especial nas mulheres. Uma das homenageadas Ă© Dodora, codinome de Maria Auxiliadora Barcelos, que foi militante e companheira de cela da presidente Dilma Rousseff. Depois de libertada, ela nĂ£o suportou conviver com a memĂ³ria do cĂ¡rcere e deu fim Ă vida. Ao lado de sua assinatura, Andreato registrou: “DoDORa”.
Elifas rechaça a inevitĂ¡vel comparaĂ§Ă£o com “Guernica”, obra de Pablo Picasso, de 1937, que retrata os horrores da guerra civil espanhola, admitindo apenas a identidade de temas. “EstĂ£o lĂ¡, no meu painel, imagens reais dos mĂ©todos de tortura praticados na AmĂ©rica Latina”.
Ele estĂ¡ consciente de toda espĂ©cie de paixões e revoltas que sua obra vai suscitar. “JĂ¡ imagino os Bolsonaros que vĂªm por aĂ”, desabafou. Por isso, faz uma recomendaĂ§Ă£o aos futuros visitantes.
- É como no conto do Eduardo Galeano, em que um filho pede ao pai que o leve para conhecer o mar e, diante da imensidĂ£o azul, pede mais, que o ajude a olhar. Eu recomendo que as pessoas levem alguĂ©m para ajudĂ¡-las a olhar o quadro”, diz. (AE)