Itaipu, uma das maiores hidrelĂ©tricas do mundo, tem um nome em lingua guarani, e este significa “pedra que canta”. O som deste nome, para os povos indĂgenas, em vez de soar como uma homenagem soa como um canto triste.
O enorme reservatĂ³rio e foi construĂdo em pleno territĂ³rio indĂgena, lugar este onde hĂ¡ sĂ©culos, os cronistas e historiadores registram a presença do povo guarani.
Durante a construĂ§Ă£o da hidrelĂ©trica mais de 100 comunidades Guarany, que viviam nas duas margens, foram vitimadas pelo impacto da instalaĂ§Ă£o da usina, sendo desalojados das terras onde viviam e a milhares de anos estĂ£o enterrados os seus antepassados.
Segundo os indĂgenas e os antropĂ³logos sĂ³ do lado brasileiro existiam aproximadamente 60 aldeias. Com a perseguiĂ§Ă£o gerada por agentes da ditadura envolvidos com o mega projeto os Ăndios, acuados, tiveram de fugir, sendo que grande parte destes rumaram para o lado paraguayo, mas aos poucos estes foram retornando para o territĂ³rio brasileiro. Para eles, habitantes histĂ³ricos, a fronteira Ă© coisa de "branco", e seu povo, hoje dividido em dois territĂ³rios, Ă© um sĂ³.
A imensa maioria dos indĂgenas atĂ© hoje nĂ£o receberam a compensaĂ§Ă£o adequada pelos territĂ³rios tradicionais que perderam: mais de 80 mil hectares, sĂ³ do lado brasileiro, segundo os cĂ¡lculos de estudiosos. EstĂ¡ Ă© a verdade, embora os atuais mandatĂ¡rios em Itaipu continuem a usar os mesmos argumentos que a ditadura usou, o de que na regiĂ£o "sĂ³ existiam 13 famĂlias indĂgenas compostas por 71 pessoas, que formavam a Comunidade de Jacutinga – de Ăndios do ramo “AvĂ¡” da NaĂ§Ă£o Guarani – em Ă¡rea de 30 hectares", o que Ă© uma grande mentira usada para esconder o quanto de mal o discurso do "progresso", a qualquer custo, gerou para estes que sĂ£o os verdadeiros donos daquelas terras. As provas fĂsicas da existĂªncia deste povo a milhares de anos naquela regiĂ£o hoje estĂ£o submersas.
Aos poucos estes vitimados pela construĂ§Ă£o da barragem, que vivem em Ă¡reas diminutas, sendo que a maior parte delas nĂ£o foram legalizadas, novamente unidos depois da grande diĂ¡spora, começam a se reorganizarem e lutam pelos seus direitos.
Os Guarany exigem a demarcaĂ§Ă£o de suas terras, o direito de receberem e gerirem a devida indenizaĂ§Ă£o pelos males que sofreram, como a construĂ§Ă£o de escolas, postos de saĂºde e o apoio alimentar.
Eles, que por justa razĂ£o nĂ£o confiam nem na Funai e muito menos na Itaipu pacificamente começaram uma onda de protestos.
Itaipu, localizada no rio ParanĂ¡, entre o Brasil e o Paraguai, completa este ano 30 anos de funcionamento. Apesar da imensa riqueza que a usina jĂ¡ gerou nessas trĂªs dĂ©cadas, a empresa que a administra foi incapaz, atĂ© hoje, de saldar a dĂvida que gerou com a remoĂ§Ă£o de dezenas de comunidades indĂgenas guarani para a formaĂ§Ă£o de seu lago, e pior, tal qual na ditadura, continua com sua prĂ¡tica a afirmar que ela inexiste.
Os Guarani do ParanĂ¡ nĂ£o sĂ£o sĂ³ daqui, pois os Guaranys integram uma extensa rede social, que começa no norte da Argentina e sĂ³ termina nas aldeias do EspĂrito Santo. Deslocando-se atravĂ©s de fronteiras que nĂ£o foram estabelecidas por eles, esses indĂgenas reivindicam dos governos dos paĂses que hoje os abrigam o reconhecimento dessa condiĂ§Ă£o transnacional.
Sem terem os seu direitos histĂ³ricos devidamente reconhecidos, na Ăºltima segunda-feira representantes de pelo menos 11 aldeias da regiĂ£o de GuaĂra e Terra Roxa, de forma pacĂfica, fecharam a ponte Ayrton Senna durante nove horas, e prometeram retomar o protesto ontem caso nĂ£o houvesse acordo.
Como fruto desta mobilizaĂ§Ă£o dos indĂgenas a lenta Funai e a omissa Itaipu vieram a mesa para a negociaĂ§Ă£o, e estĂ¡ trouxe de imediato alguns resultados ainda nĂ£o definitivos, embora alguns paliativos deverĂ£o serem tomados.
O coordenador da Funai, Pedro Possamai, afirmou que alguns problemas emergenciais, como de alimentaĂ§Ă£o, estĂ£o previamente resolvidos. As cestas bĂ¡sicas antes enviadas pelo MDS (MinistĂ©rio do Desenvolvimento Social e Combate Ă Fome) a partir da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) que haviam sido cortadas, serĂ£o repassadas momentaneamente pela Funai. “isso ocorrerĂ¡ atĂ© o momento que o MDS retomar o repasse”.
Em relaĂ§Ă£o Ă demarcaĂ§Ă£o de terras, questĂ£o mais importante e definitiva, uma equipe que coordenarĂ¡ o grupo de trabalho a ser formado, vinda de BrasĂlia, estarĂ¡ na regiĂ£o entre agosto e setembro para fazer a anĂ¡lise e estudo das Ă¡reas onde as aldeias estĂ£o instaladas e que estĂ£o sob litĂgio.
Em relaĂ§Ă£o ao governo do ParanĂ¡, a muito por parte do governo estadual existe a intenĂ§Ă£o de agir em favor dos Ăndios, mas isto sĂ³ serĂ¡ possĂvel caso ocorra a autorizaĂ§Ă£o judicial, jĂ¡ que as Ă¡reas em que os indĂgenas estĂ£o instalados ainda nĂ£o form desapropriadas, portanto nĂ£o estĂ£o demarcadas peloa UniĂ£o.
Segundo o secretĂ¡rio estadual de Assuntos FundiĂ¡rios, Hamilton Serighelli,, esse Ă© o maior de todos os entraves jĂ¡ que o Estado e a UniĂ£o ficariam impedidos de construir escolas, por exemplo, em Ă¡reas que estĂ£o em disputa judicial. Como a educaĂ§Ă£o Ă© outro fator reivindicado, o que deverĂ¡ ocorrer Ă© o pedido, via JudiciĂ¡rio, da permissĂ£o a partir de uma liminar que favoreça a edificaĂ§Ă£o de trĂªs unidades itinerantes, uma em GuaĂra, outra em Terra Roxa e outra em Santa Helena.
Todas as reivindicações apresentadas pelo povo Guarany sĂ£o antigas e jĂ¡ constam em duas ações civis pĂºblicas movidas pelo MPF contra o Estado e a UniĂ£o. Entre as medidas que consta nessas reivindicações tambĂ©m estĂ¡ o abastecimento de Ă¡gua potĂ¡vel em todas as aldeias, o que o representante da Funai disse que Ă© uma das questões que tambĂ©m deve ser resolvidas nos prĂ³ximos dias.