domingo, 13 de fevereiro de 2011

É um erro falar que existe nova classe média, diz sociólogo


Autor do livro "Os Batalhadores Brasileiros", o sociólogo Jessé Souza afirma que a ascensão social de 30 milhões de pessoas no governo Lula não produziu uma "nova classe média", mas uma classe social diferente, que ele chama provocativamente de "batalhadores".

Assim como fizera em seu livro anterior, Souza procura determinar as características dessa classe por um recorte diferente do que ele chama de economicista e quantitativo, fugindo tanto de análises pelo consumo e renda quanto de abordagens marxistas "unidimensionais".

Abaixo, trechos da entrevista sobre a classe que, para ele, "parece se constituir, com o resgate social da ralé, na questão social, econômica e política mais importante do Brasil contemporâneo".

Folha - Após lançar o livro "A Ralé Brasileira", o senhor agora publica "Os Batalhadores Brasileiros". Qual a diferença entre a "ralé" e os "batalhadores"?

Jessé Souza - Os dois livros se enquadram no projeto de longo prazo de estudar as classes sociais mais importantes do Brasil contemporâneo de maneira não economicista e quantitativa, como sempre acontece.
Quando falo em estudos economicistas, penso tanto nas descrições estatísticas baseadas em níveis de consumo e renda quanto nas descrições marxistas fundadas numa leitura unidimensional da realidade.
Alguns desses estudos são importantes como ponto de partida descritivo, mas o que nenhum deles oferece é uma leitura sociocultural da realidade que nos possibilite compreender o principal: a produção diferencial de seres humanos a partir do pertencimento a classes sociais distintas.
Ainda que a renda seja um componente importante do pertencimento de classe, pessoas muitos diferentes podem ter renda semelhante.
Para que possamos explicar e compreender uma realidade social complexa é necessário penetrar na dimensão mais recôndita das motivações profundas do comportamento social e nos dramas, sonhos, angústias e sofrimentos humanos que elas implicam.
O ganho em compreensão em relação a uma realidade opaca e complexa é insofismável.
Acredito que, por conta desse tipo de interesse instruído teórica e metodologicamente, foi possível perceber, talvez pela primeira vez, a existência do um terço de brasileiros excluídos como uma única classe, ou seja, pelo estudo dos pressupostos afetivos, morais e emocionais que explicam a origem, a manutenção e o destino social provável às pessoas dessa classe específica.
No caso da "ralé", formada pela ausência dos pressupostos que permitem a incorporação das capacidades exigidas pela sociedade competitiva moderna, é possível perceber a irmandade entre pessoas que moram no interior do Piauí ou na periferia de São Paulo quando a regra é a fragmentação e, portanto, a cegueira da percepção.
É essa cegueira que percebe essa classe de abandonados sociais apenas no registro espetacularizado e manipulador da oposição polícia/bandido, aprofundando todos os preconceitos das classes do privilégio contra esses esquecidos, explorados como mão de obra barata por esses mesmos privilegiados.
O ganho em termos de uma percepção alternativa, totalizadora e crítica da realidade social como um todo não é pequeno.
No caso dos "batalhadores", esse mesmo ponto de partida nos permitiu, na contramão dos estudos dominantes sobre esse assunto, perceber tanto o potencial de chance e de oportunidade que efetivamente existe nessa nova classe que se constitui defronte os nossos olhos quanto articular a dimensão do sofrimento e dor humanos sistematicamente silenciados por uma leitura superficial e triunfalista da realidade.

Em seu livro, o senhor questiona a afirmação de que o governo Lula alçou 30 milhões de brasileiros à classe média e diz até que se trata de uma mentira. Por quê?

Eu não nego que houve uma efetiva ascensão social de 30 milhões de brasileiros nem que esse fato seja extremamente importante e digno de alegria. O que questiono é a leitura dessa classe como uma classe média.
A classe média é uma das classes dominantes em sociedades modernas como a brasileira porque é constituída pelo acesso privilegiado a um recurso escasso de extrema importância: o capital cultural nas suas mais diversas formas.
Seja sob a forma de capital cultural técnico, como na "tropa de choque" do capital (advogados, engenheiros, administradores, economistas etc.), seja pelo capital cultural literário dos professores, jornalistas, publicitários etc., esse tipo de conhecimento é fundamental para a reprodução e legitimação tanto do mercado quanto do Estado.
Consequentemente, tanto a remuneração quanto o prestígio social atrelados a esse tipo de trabalho --e da condução de vida que ele proporciona-- são consideráveis.
A vida dos "batalhadores" é completamente outra. Ela é marcada pela ausência dos privilégios de nascimento que caracterizam as classes médias e altas.
E, quando se fala de "privilégios de nascimento", não se está falando apenas do dinheiro transmitido por herança de sangue nas classes altas. Esses privilégios envolvem também o recurso mais valioso das classes médias, que é o tempo.
Afinal, é necessário muito tempo livre para incorporar qualquer forma de conhecimento técnico, científico ou filosófico-literário valioso.
Os batalhadores, em sua esmagadora maioria, precisam começar a trabalhar cedo e estudam em escolas públicas muitas vezes de baixa qualidade.
Como lhes faltam tanto o capital cultural altamente valorizado das classes médias quanto o capital econômico das classes altas, eles compensam essa falta com extraordinário esforço pessoal, dupla jornada de trabalho e aceitação de todo tipo de superexploração da mão de obra.
Essa é uma condução de vida típica das classes trabalhadoras, daí nossa hipótese de trabalho desenvolvida no livro que nega e critica o conceito de "nova classe média".

Qual o ganho analítico de enxergar os batalhadores como uma classe diferente da classe média tradicional? E quais as implicações que essa diferenciação traz para o governo Dilma?

O ganho é tanto analítico quanto político.
Essa diferenciação permite, em primeiro lugar, perceber a realidade social como ela é, com suas ambiguidades e contradições constitutivas.
Depois, como em toda leitura sóbria da realidade, ela possibilita criticar todo tipo de manipulação política ou de leitura triunfalista da realidade.
Com relação não apenas ao governo Dilma, mas em relação ao futuro do Brasil, essa nova classe de trabalhadores, típica do novo tipo de capitalismo financeiro que logrou se globalizar, parece se constituir --com o resgate social da ralé-- na questão social, econômica e política mais importante do Brasil contemporâneo.
Para mim, existem duas alternativas possíveis: a primeira é essa classe ser cooptada pelo discurso e prática individualista e socialmente irresponsável que caracterizam boa parte das classes dominantes no Brasil; a segunda alternativa é essa classe assumir um papel de protagonista e inspirar, pelo seu exemplo social, a efetiva redenção daquela classe social de humilhados sociais que chamo provocativamente de ralé.
Muitos dos batalhadores que entrevistamos vinham, inclusive, da própria ralé, mostrando que as fronteiras entre as classes são fluidas e que não existem classes condenadas para sempre.
Esse ponto me parece fundamental, já que é precisamente a existência desses abandonados sociais --e não qualquer tipo de patrimonialismo advindo de um suposto "mal de origem" português, como ainda hoje acredita nossa ciência social dominante-- o que nos separa das sociedades mais igualitárias e socialmente mais justas do globo.

Quando o senhor afirma que os batalhadores alcançaram um "lugar ao sol à custa de extraordinário esforço", o senhor não está assumindo a tese do mérito individual, a qual o senhor habitualmente critica?

Quando critico a ideologia do mérito individual, não estou negando a extraordinária importância do esforço individual, nem, muito menos, a necessidade de reconhecimento social efetivo para os desempenhos singulares em qualquer área da vida.
Qualquer noção de justiça social moderna tem que articular responsabilidade social e reconhecimento dos desempenhos singulares e extraordinários.
Há que proteger tanto a ideia de que somos responsáveis uns pelos outros quanto estimular o esforço pessoal.
Quando critico a ideia de mérito individual, é apenas pelo seu uso amesquinhado como ideologia, ou seja, como falsa percepção da realidade.
É muito diferente quando uma classe inteira de privilegiados de nascimento, com boas escolas, estimulados em casa o tempo todo, com tempo livre desde sempre para fazer o que bem entende e dinheiro para investir em cursos de línguas e pós-graduações valorizadas, chama o próprio sucesso de mérito individual e ainda acusa as classes que não tiveram acesso a qualquer desses privilégios sociais de preguiçosos, burros e culpados pelo próprio fracasso.
A tese do mérito individual que crítico é, portanto, herdeira do modo como o liberalismo sempre foi recebido no Brasil: um discurso para legitimar os privilégios de nascimento das classes abastadas, como se esses privilégios decorressem do esforço apenas de indivíduos, e não da herança de sangue e de classe.
No estudo dos batalhadores, o que impressionou foi o extraordinário esforço de superação de condições efetivamente adversas, todas contribuindo antes ao desânimo e ao desespero do que ao enfretamento corajoso das condições negativas ao sucesso social e econômico.
O título do livro foi uma homenagem à luta cotidiana e silenciosa desses brasileiros.
Este termo "batalhadores" sinaliza o fato de que o que perfaz o cotidiano dessas pessoas é a necessidade de "matar um leão por dia" como forma de vida de toda uma classe social que tem que lutar diariamente contra o peso da própria origem.

Nos casos empíricos de seu livro, há operadores de telemarketing, uma profissão relativamente nova, e feirantes, ocupação bem antiga. Como as duas funções aparecem juntas para caracterizar tipos de uma nova classe social que é tão conforme o modelo atual do capitalismo?

Para responder a esta pergunta, temos que compreender, antes de tudo, ainda que sucintamente, o que significa "modelo atual de capitalismo", de modo a podermos compreender de maneira mais adequada como essa "nova classe trabalhadora" se torna, não só no Brasil, mas em todos os países emergentes, como China e Índia, sua classe suporte, como diria Max Weber, mais típica.
O que hoje é chamado por muitos de "capitalismo financeiro" representa um movimento que começa nos anos 80 no mundo e se propaga nos anos 90 entre nós. O pano de fundo desse movimento eram taxas de lucro decrescentes em nível mundial já havia décadas.
Mas as mudanças não foram apenas nem principalmente de retórica política. Elas comandaram transformações profundas tanto na forma de produção de todo tipo de mercadoria quanto no regime de trabalho.
Ao fim e ao cabo, o conjunto de mudanças apontou no sentido de um aumento da velocidade de circulação do capital, em grande medida determinado pelos cortes com gastos de controle e supervisão de trabalho, que caracterizavam a produção do tipo fordista tradicional, como existe ainda hoje, por exemplo, em algumas indústrias automobilísticas.
Amplos setores da produção de mercadorias de todo tipo são realizados agora por trabalhadores em fábricas a céu aberto ou pequenas unidades familiares que se acreditam, inclusive, empresárias de si próprias, o que explica, também, que o epíteto de "nova classe média" tenha caído tão rápido no gosto de todos, inclusive dos próprios batalhadores.
Na verdade, o capital financeiro que flui sem qualquer controle por todos os pontos do globo pode, agora, se valorizar a taxas de lucros e juros sem precedentes também a partir de atividades realizadas por um exército mundial de trabalhadores --que abundam precisamente nos países populosos ditos emergentes-- sem direitos trabalhistas, sem passado sindical e sem tradição de lutas políticas, que muitas vezes não pagam impostos, que trabalham de dez a 14 horas ao dia e ainda nem sequer precisam de capatazes ou supervisores, porque se acreditam "livres" e patrões de si mesmos.
Essa mudança abrange não apenas as "novas atividades", como as da informática, mas também redefinem e transformam, inclusive, atividades tradicionais, como a dos feirantes.

Quais são os valores dessa classe batalhadora?

Em primeiro lugar, há que ficar bem claro que uma pesquisa sobre valores sociais profundos, como a que realizamos, não pode imaginar que esses valores sejam de fácil acesso e estejam na cabeça das pessoas de modo claro e óbvio.
Ao contrário, como diria Max Weber, a primeira necessidade dos seres humanos não é a de dizer a verdade --muito menos a verdade sobre si mesmos--, mas sim justificar e legitimar a vida que realmente levam.
Por conta disso, uma pesquisa de sociologia crítica é diferente de uma pesquisa meramente quantitativa. Nas pesquisas quantitativas podemos saber, por exemplo, em quem as pessoas vão votar ou que sabonete elas usam, precisamente porque suas autoimagens quase nunca estão em jogo nesse tipo de questão.
Quem se interessa em perceber os estímulos mais profundos da conduta social, ao contrário, tem que realizar um esforço interpretativo e hermenêutico que as pesquisas quantitativas comuns não fazem e perceber os valores na prática cotidiana efetiva da vida das pessoas.
Afinal, valores são aquilo que nos conduzem para um lado e não para outro da vida, mesmo que de modo pré-reflexivo ou inconsciente.
Nós optamos por analisar a vida no trabalho e na família de nossos informantes, de modo a retirar dessas esferas fundamentais os impulsos e estímulos práticos --os tais "valores" na nossa visão-- da conduta de vida.
Neste particular, o horizonte valorativo dos batalhadores pode ser mais bem percebido no confronto com os membros da ralé.
A principal diferença em relação aos excluídos e abandonados sociais é a constituição de uma ética articulada do trabalho duro.
Afinal, não basta querer trabalhar em qualquer área da vida. É necessário também poder trabalhar, ou seja, ter logrado incorporar (literalmente "tornar corpo", de modo pré-reflexivo e automático) os pressupostos emocionais e morais do trabalho produtivo no mercado competitivo.
O capitalismo atual pressupõe crescente incorporação de distintas formas de conhecimento e de capital cultural como porta de entrada em qualquer de seus setores competitivos.
Como esses pressupostos faltam por diversos motivos à ralé, esta é condenada aos trabalhos braçais ou com mínimo de conhecimento, servindo, portanto, de mão de obra barata para qualquer serviço duro, desvalorizado e pesado.
Esse não é o único horizonte dos batalhadores.
Os batalhadores são quase sempre vindos de famílias pobres, mas, no entanto, bem estruturadas, com os papéis de pais e filhos reciprocamente compreendidos, exemplos de perseverança na família e estímulo consequente --baseado em exemplos concretos-- para o estudo e para o trabalho.
Temos nas famílias dessa classe a incorporação e internalização efetiva da tríade disciplina, autocontrole e pensamento prospectivo que sempre está pressuposta tanto em qualquer processo de aprendizado na escola quanto em qualquer trabalho produtivo no mercado competitivo.
Sem disciplina e autocontrole é impossível, por exemplo, concentrar-se na escola --daí que os membros da ralé diziam repetidamente que "fitavam" o quadro negro por horas sem aprender.
Essa "virtude" não é natural, como pensa a classe média que universaliza indevidamente às outras classes suas virtudes e privilégios para depois culpar a vítima do abandono social, como se o abandono e a miséria fossem uma escolha.
Por outro lado, sem pensamento prospectivo --ou seja, a visão de que o futuro é mais importante do que o presente--, não existe sequer a possibilidade de condução racional da vida pela impossibilidade de cálculo e de planejamento e pela prisão no aqui e agora.
No caso dos batalhadores, a incorporação dessa economia emocional e moral mínima é duramente conquistada, às vezes no horizonte do aprendizado familiar, às vezes tardiamente, nas mais diversas formas de socialização religiosa.
Assim, ainda que falte a essa classe o acesso às formas mais valorizadas de capital cultural --monopólio das "verdadeiras" classes médias--, não lhes falta força de vontade, perseverança e confiança no futuro, apesar de todas as dificuldades.
Em um contexto minimamente favorável, como o que vivemos até agora, esse exército de batalhadores se mostra então disponível e atento à menor possibilidade de trabalho rentável e de melhoria das condições de vida por meio, por exemplo, do consumo de bens duráveis que antes lhes eram inatingíveis.

Durante as eleições deste ano, alguns debates ganharam fortes contornos religiosos, como foi o caso da discussão sobre o aborto. A religião é mais importante para os batalhadores do que para a classe média tradicional?

O tema da religião é tão importante para essa classe que até dedicamos toda uma parte do livro a esta temática. Além disso, a socialização religiosa dessa classe perpassa boa parte dos textos construídos a partir das análises empíricas.
É preciso cuidado com esse tema, já que ele pode servir para que se construa uma nuvem de preconceitos contra essa classe.
É, sem dúvida, correto que as religiões evangélicas --como, aliás, todas as religiões em alguma medida-- exigem o sacrifício do intelecto, o que, efetivamente, não ajuda no exercício da tolerância nem no desenvolvimento das capacidades reflexivas dos seres humanos.
Em troca, no entanto, essas religiões oferecem o que a sociedade como um todo, o Estado ou mesmo algumas das famílias menos estruturadas dessa classe jamais deram a eles: confiança em si mesmos, autoestima, esperança e a força de vontade para vencer as enormes adversidades da vida sem privilégios de nascimento.
Nesse sentido preciso, tudo leva a crer que a religião seja efetivamente mais importante para esses setores do que para as classes médias estabelecidas, ainda que nunca tenhamos feito nenhum estudo sistemático. Mas me parece uma hipótese plausível.
E não apenas as religiões evangélicas, que são muito importantes especialmente nos núcleos urbanos. Também a religião católica, no interior do Nordeste, ainda muito forte e atuante, cumpre uma função fundamental de baluarte da solidariedade familiar e como fundamento de uma ética do trabalho em muitos aspectos semelhantes à ética do protestantismo.

Se é verdade que a classe batalhadora não é uma classe média em sentido tradicional, e se aí vai uma crítica, não é possível ao menos imaginar que os filhos dos "batalhadores" terão melhores oportunidades que seus pais? Nesse sentido, a crítica não perderia sua força? Não é possível imaginar que a ascensão à classe média se dará em "duas etapas"?

Sem dúvida que isso é possível. Até porque o Brasil é um país singular no sentido de ser extremamente desigual e, ao mesmo tempo, apresentar forte mobilidade social muitas vezes ascendente.
É preciso, no entanto, também levar em consideração que uma concepção sociocultural das classes sociais implica a percepção de que as mudanças sociais tendem a preservar aspectos importantes da história e da tradição das classes sociais envolvidas nessas mudanças.
Como nos constituímos como seres humanos de modo antes de tudo afetivo e emocional, pela incorporação insensível e pré-reflexiva daquilo e de quem amamos, somos sempre muito mais parecidos com nossos pais --ou de quem quer que tenhamos recebido afeto e amor-- do que as vezes muitos imaginam.
Mas o que é importante é que as mudanças sociais e pessoais são, sim, sempre possíveis. Mais importante ainda é lembrar que as mudanças sociais jamais acontecem apenas pelo jogo das variáveis econômicas.
O aprofundamento dos processos de aprendizado social e político que o Brasil começa a realizar são também fundamentais para a constituição de uma sociedade em que todos tenham efetiva condição de participar da competição social com um mínimo de igualdade de condições, que é o que muitos entre nós desejam.

A nova classe batalhadora faz surgir um novo tipo de preconceito no Brasil?

Sem dúvida. Basta olhar qualquer das revistas que analisam o padrão de consumo dessa classe sob a égide da visão de mundo da classe média estabelecida. Ela aparece sempre como um tanto vulgar e sem o "bom gosto" que caracterizaria os estratos superiores.
Como regra geral, as classes superiores se veem sempre como as "classes do espírito", da personalidade refinada e sensível, e percebem as classes baixas como as "classes do corpo" e, portanto, rudes, primitivas e sem refinamento.

Uma das características dos "batalhadores" parece ser a precariedade da situação econômica e social. De que forma o governo pode melhorar ou piorar a situação dessa classe?

Eu acho fundamental o aprofundamento mais consequente tanto da política social --no sentido de que apenas uma pequena ajuda econômica tópica não irá retirar o um terço de brasileiros da exclusão e do abandono-- quanto de políticas de crédito e de estímulo aos batalhadores.
A "parte de baixo" da população brasileira tem demonstrado sobejamente que consegue transformar qualquer pequena ajuda em progresso social e econômico significativo que interessa e beneficia a todos os setores da sociedade inclusive os superiores.

Governo ressuscita taxa de 1946 sobre portos brasileiros

O governo federal decidiu ressuscitar um decreto-lei de 1946 para iniciar a cobrança de uma taxa pelo uso do espelho d’água em portos, marinas, estaleiros e plataformas. A medida, prevista na Portaria 24, do dia 28 de janeiro, não só vai na contramão das reivindicações da sociedade para reduzir a carga tributária, como também vai diminuir a competitividade do produto nacional, uma vez que elevará o custo do frete.

De acordo com a portaria, todas as estruturas privadas que estejam em espaços físicos em águas públicas terão 180 dias para regularizar a situação na Secretaria do Patrimônio da União (SPU), ligada ao Ministério do Planejamento. Isso inclui atividades institucionais, habitacionais, de lazer, comerciais ou industriais. No caso dos portos privativos, o não cumprimento da regra será passível de multas e até a perda de autorização - ou concessão -, afirma o superintendente de Portos da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Giovanni Paiva.

Ele explica que, para a agência conceder uma outorga, ela precisa de uma série de licenças de outros órgãos, como do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da SPU. “Eu somo licenças. Sem uma delas, não consigo concluir o processo.” O executivo conta que a regra de tributação do espelho d’água é antiga, mas só agora a SPU resolveu operacionalizá-la no setor.

O diretor da SPU, Luciano Roda, explica que a água é um bem de uso comum. Portanto, precisa ser taxada, a exemplo do que ocorre com áreas da União. “A portaria é resultado da aproximação entre a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e a secretaria.” Para ele, nada mais justo que uma empresa privada que usa o espaço público e tem lucros pagar por isso. O presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli, destaca que, nesse caso, essas companhias usam, de fato, a água. Nos portos, os terminais não retiram água do mar (ou do rio) para usar.

China elevou compulsório de alguns bancos, diz jornal

A China pediu que alguns bancos pequenos e médios depositem mais reservas no banco central, para controlar a inflação e o agressivo crescimento econômico, informou o China Securities Journal, citando fontes. A reportagem diz que o aumento da taxa do compulsório, que entrou em vigência no começo desta semana, teve como alvo principalmente os bancos regionais.

Segundo o jornal, como as pressões inflacionárias permanecem, a China provavelmente vai manter uma posição dura em relação ao aperto monetário no primeiro trimestre deste ano. O Banco do Povo da China (PBOC, o banco central do país) vai continuar usando taxas de compulsório bancário diferenciadas para administrar o crescimento do crédito em bancos individuais.

Os bancos chineses geralmente aumentam os empréstimos no começo de cada ano, para manter ou expandir sua participação no mercado de crédito do país. O jornal afirmou que os bancos chineses forneceram mais de 1,2 trilhão de iuans (US$ 182,2 bilhões) em novos empréstimos em janeiro. No mesmo mês do ano passado, os novos empréstimos totalizaram 1,4 trilhão de iuans.

No mês passado, o China Securities Journal afirmou que o governo chinês planeja cortar os novos empréstimos em yuan em cerca de 10% neste ano. O governo também teria ordenado os bancos a limitarem o crédito em janeiro para 12% da meta para todo o ano, que é uma faixa entre 7,2 trilhões de iuans e 7,5 trilhões de iuans. Nos dois últimos anos, os bancos chineses forneceram 17,55 trilhões de iuans em empréstimos para dar suporte aos estímulos econômicos do governo.

Reduzir o crédito é uma das ferramentas do governo chinês para tentar combater a inflação. O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) da China subiu 4,6% em dezembro, depois de ter crescido 5,1% em novembro - a taxa de inflação mais alta em mais de dois anos. O governo deve anunciar a inflação de janeiro em torno do dia 15 deste mês. Economistas acreditam que a taxa ficará acima de 5%. As informações são da Dow Jones.

Reino Unido pede ação internacional contra ativos de Mubarak


Um ministro britânico afirmou no domingo que deve haver uma ação internacional para lidar com os ativos internacionais do presidente deposto do Egito, Hosni Mubarak, e de sua família.

A Agência Britânica de Combate a Fraudes Graves (SFO), que investiga crimes financeiros, lançou uma caçada por dinheiro e ativos vinculados a Mubarak, publicou o Sunday Times, sem citar fontes.

Até agora, apenas a Suíça anunciou um congelamento de ativos que podem pertencer a Mubarak, que deixou o poder na sexta-feira após 30 anos no comando do Egito.

O ministro britânico do Reino Unido, Vince Cable, afirmou que os países precisam trabalhar juntos para identificar os ativos de Mubarak, avaliados em pelo menos milhões de dólares e que são mantidos em locais secretos espalhados pelo mundo.

Perguntado se a Inglaterra seguirá a Suíça no congelamento dos ativos, Cable afirmou à televisão BBC: "Não estou ciente que existam enormes ativos, mas há claramente necessidade de haver uma ação internacional sobre isso."

"Não há sentido em um governo agir sozinho, mas certamente temos que ver isso. Depende também se os recursos dele são ilegais ou se foram ilegalmente obtidos."

A Inglaterra pode congelar qualquer ativo vinculado a Mubarak a pedido da União Europeia ou das Nações Unidas, ou a pedido direto do Egito, disse ele.

O embaixador do Egito em Londres, Hatem Seif el Nasr, disse que ele não tem informações sobre qualquer ativo de Mubarak. "Sinceramente, sobre o dinheiro, eu não tenho absolutamente qualquer conhecimento", disse ele à BBC.

A Suíça também congelou ativos pertencentes ao ex-presidente da Tunísia Zine al-Abidine Ben Ali, que foi retirado do poder por uma revolta popular no mês passado.

Os muçulmanos querem mais ciência

O mundo islâmico deu sua contribuição para o impulso que a ciência recebeu no Ocidente cristão no fim da Idade Média e no Renascimento, mas depois a ciência entrou em declínio nas regiões dominadas pelo Islã. Uma reportagem da Reuters publicada ontem mostra como, na Arábia Saudita, uma educação pobre em ciência deixou os jovens em uma situação precária, se comparada à de estudantes ocidentais. E isso em um país que está sentado sobre uma parcela considerável do petróleo mundial.
No entanto, os próprios estudantes perceberam a enrascada em que estavam se metendo e foram às ruas em protesto. O rei Abdullah bin Abdul-Aziz decidiu que era hora de modernizar a educação do país e criou um programa que, entre algumas de suas principais novidades, incluía mais aulas de ciências. O problema é que os entusiastas da inovação estão perdendo terreno. A Reuters explica que o rei e o príncipe herdeiro andam doentes, ou seja, têm mais com o que se preocupar. O príncipe Nayef bin Abdul-Aziz, outro candidato ao trono, tem ligações fortes com o clero local, que não vê com bons olhos as reformas educacionais.

A vantagem saudita é que o país tem dinheiro para investir. A Reuters menciona universidades novinhas em folha que custaram bilhões de dólares e bolsas de estudo para que dezenas de milhares de jovens sauditas estudem na Europa ou nos Estados Unidos. E o desejo dos estudantes por uma melhor formação científica não parece vir atrelado a uma revolta contra sua religião. Pelo menos nenhum dos entrevistados pela Reuters se manifestou assim. O que o rei deseja expressamente é combater o extremismo religioso, e não a religião. A desvantagem é um clero que não entende o que o estudo da ciência pode trazer para a juventude e para a economia do país. Pelo que dizem as autoridades entrevistadas, a queda de braço ainda vai durar alguns anos.

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Jordanianos vão às ruas para pedir a renúncia do premiê

Dois grupos distintos, compostos por centenas de jordanianos, realizaram protestos hoje na capital Amã. Um grupo pedia a renúncia do novo primeiro-ministro, Marouf al-Bakhit, enquanto o outro queria a saída do presidente do Egito, Hosni Mubarak.

Cerca de 400 jordanianos de esquerda protestaram pela saída de Al-Bakhit, pois defendem a eleição direta para o cargo. Em outro lado da capital, cerca de 400 partidários do grupo fundamentalista Irmandade Muçulmana pediam a queda de Mubarak gritando: "Hosni Mubarak, vá embora, o mundo árabe está em chamas".

O gabinete de Al-Bakhit tomou posse na quarta-feira, uma semana depois de seu antecessor ter sido demitido, em meio a reclamações de que não estava realizando reformas na velocidade esperada. As informações são da Associated Press.

Dirceu nega estar em campanha para ser absolvido no STF

O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT) negou que a visita que fez ontem a Curitiba fosse o início de uma campanha de mobilização da militância petista para sua absolvição no processo que julga o caso “mensalão” no Supremo Tribunal Federal (STF). A interpretação havia sido divulgada pela imprensa nacional a partir de declarações dadas pelo ex-ministro na festa de aniversário do PT, na última quinta-feira. “Não faz sentido. Quem decide são os 11 ministros do STF. Vou viajar o país como sempre fiz e não para fazer campanha. Foi uma interpretação errada do que eu falei”, disse ontem em Curitiba.

O ex-ministro reafirmou que espera ser julgado o mais rápido possível para que possa provar sua inocência. Se o processo do mensalão não for julgado até agosto uma das penas que poderiam ser aplicadas, na hipótese de uma condenação, pode prescrever.

Dirceu, no entanto, demonstrou confiança na absolvição. “Espero que haja justiça, que não seja um processo político, que o Supremo não seja pressionado para esse lado ou para aquele. Deixem a Justiça fazer justiça”, afirmou.

Sobre um possível retorno do ex- tesoureiro Delúbio Soares ao PT, Dirceu, que é membro do diretório nacional, evitou comentar. “Até que ele faça um pedido formal de refiliação não há razão para pensar nisso”, disse. Delúbio e Dirceu são acusados pelo Ministério Público Federal de serem os principais articuladores do mensalão.

Supremo

Denúncias podem prescrever

O caso conhecido como “mensalão” foi denunciado em 2005 pelo deputado federal cassado Roberto Jefferson (PTB), que também é réu no processo. Parlamentares da base aliada do governo Lula foram acusados de receber pagamentos periódicos, de R$ 30 mil, para votar de acordo com os interesses do Planalto, durante o primeiro mandato do ex-presidente.

Segundo Jefferson, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu seria o respon-sável pelos pagamentos. Em agosto de 2007, o STF recebeu a denúncia contra 38 réus. O Supremo deve julgar o processo neste ano para evitar prescrições no caso das penas menores, se os acusados forem condenados.

O primeiro prazo começa a contar a partir de 28 de agosto de 2011, caso sejam aplicadas penas inferiores a dois anos de prisão por crimes de formação de quadrilha. Esta é a acusação com a menor pena prevista contra 23 dos acusados. Entre eles, José Dirceu. Se até lá o Supremo não tiver realizado o julgamento, esses réus estão automaticamente livres da punição.

O relator, ministro Joaquim Barbosa, promete colocar a questão em pauta a tempo de evitar prescrições.

“Donos” do sistema eleitoral vão chefiar a reforma política

Político mais longevo do Congresso Nacional, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), puxou para si a responsabilidade de mudar as regras de um modelo político-eleitoral que ajuda a mantê-lo com mandatos consecutivos há 56 anos, sem nenhuma derrota em dez campanhas disputadas.


Nesta semana, ele deu a cara da comissão especial que será instalada nos próximos dias e que terá um mês e meio para apresentar uma proposta. Para conduzir os trabalhos, foram escalados os políticos mais tradicionais com assento na Casa, como os ex-presidentes da República Fernando Collor (PTB-AL) e Itamar Franco (PPS-MG).

Há quatro anos, a estratégia de deixar a reforma nas mãos de uma “elite” parlamentar foi testada e não prosperou. Na época, Arlindo Chinaglia (PT-SP), então presidente da Câmara, costurou acordos com lideranças das principais legendas e reservou a pauta de votações em plenário por quase um mês para apreciar a reforma política. Os temas centrais do projeto previam o financiamento público de campanha, o fim das coligações partidárias e a adoção de listas fechadas para eleições proporcionais (pelas quais o eleitor votaria apenas no partido e não no candidato). Apesar do consenso entre PT, PSDB e DEM, as votações empacaram.

Só a proposta das listas fechadas foi votada – e rejeitada por 252 votos a 181. O resultado foi patrocinado por uma revolta dos parlamentares com menos poder na política interna dos partidos e que temiam ser preteridos por caciques na formulação das listas partidárias que indicariam os eleitos. Apenas o PT, que havia fechado questão pela mudança, teve cerca de 30 deputados que mudaram de opinião em cima da hora.

Diferenças

Em 2011, a retomada da discussão começa em torno das mesmas três propostas. A diferença é que ganham força outras sugestões em relação às listas fechadas, como o voto distrital, o voto distrital misto e o “distritão” (veja as características dos modelos no quadro ao lado). Atualmente, o sistema das eleições proporcionais (para vereador, deputado estadual e federal) é o de lista aberta – na qual, mesmo sem muitas vezes saber, o eleitor vota primeiro no partido (ou coligação) e depois no candidato.

Pelo voto distrital puro, haveria uma divisão do eleitorado em distritos, que elegeriam candidatos restritos à sua região por uma escolha majoritária (ganha quem tiver mais votos). Já pelo voto distrital misto, o eleitor votaria duas vezes, primeiro em um parlamentar do seu distrito e depois em um partido pelo sistema de listas fechadas. Por último, o modelo do “distritão” apenas substituiria a eleição proporcional pela majoritária.

Ao contrário de 2007, hoje há mais discordâncias entre os maiores partidos no Congresso. O PT quer as listas fechadas, mas aceitaria o voto distrital misto como segunda opção. O PMDB é favorável ao “distritão”, enquanto o PSDB defende o voto distrital puro com ressalvas. Sem as listas fechadas, não há consenso sobre a possibilidade de implantação do financiamento público de campanhas.

Há duas semanas, o portal de notícias G1 (g1.com.br) publicou uma enquete com 414 dos 513 deputados sobre as listas fechadas – 181 disseram ser contra, 175 a favor e 58 não sabiam. Outra pesquisa, feita na semana passada pelo jornal Valor Econômico, mostrou que apenas 192 deputados pertencem aos seis partidos que defendem o sistema – PSC, PCdoB, DEM, PSol, PT e PPS. Já o “distritão” é a primeira opção de PMDB, PP e PR, que têm 126 deputados.

Cautela

Assim como no Senado, a Câmara também formará uma comissão especial para tratar a reforma. O presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), têm sido mais cauteloso nas declarações que Sarney. Ele defende uma reforma “fatiada”, dividindo os principais temas em projetos distintos para facilitar a formação de consensos – mesma tentativa encabeçada pelo então presidente Lula após as eleições municipais de 2008 e que também empacou no Congresso.

“Todas as vezes que um grupo de pessoas que se considera ‘iluminado’ tenta impor algo contra a visão geral do povo, dá errado”, opina o cientista político da Uni­ver­­sidade Federal da Bahia Jovi­niano Neto. Segundo ele, além de defender os interesses corporativos, os congressistas acabam pressionados pelo pensamento hegemônico da população. “Para o bem e para o mal, o brasileiro vota no candidato, não no partido. É um fenômeno que precisa ser entendido, respeitado e não alterado à força.”

Para outros envolvidos no debate, os problemas decorrem de uma crise de representação do Congresso. “O povo se interessa mais pelas questões locais, por isso precisaria eleger representantes mais próximos da sua realidade. Pesquisamos muito e chegamos à conclusão de que o primeiro passo é adotarmos o voto distrital misto”, diz o presidente da Federação das Indústrias do Paraná (FIEP), Rodrigo Rocha Loures. A entidade encabeça a Rede de Participação Política, iniciativa apartidária que envolve 10 mil pessoas no estado.

Representante da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, Lucídio Bicalho concorda com o problema, mas não com a solução. “As regras de preenchimento das listas partidárias podem espelhar um retrato melhor do Brasil. É a oportunidade de aumentar, por exemplo, a participação feminina”, justifica. A Plataforma é um espaço de discussão política criado durante o escândalo do mensalão, em 2005 que hoje reúne 28 fóruns, redes e organizações sociais em torno da discussão sobre reforma política.(AE)

 
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